Diferente

Manhã de sábado ardente, convidando à contemplação do mar. Na praia, um grupo de jovens, rapazes e raparigas de corpo bronzeado, jogava uma partida de râguebi informal. Encostei a bicicleta para beber água e vê-los um pouco naquela alegria que celebrava o verão que se acaba sem saber.

Um puto escanzelado, negro, saltava e corria mais do que os outros. “Júlio, passa!”, gritavam os amigos. E o Júlio, egoísta, entusiasmado, não passava e lançava-se, sozinho, contra a muralha de corpos adversários. Perdia a bola e levantava-se, a rir, procurando qualquer coisa na areia. Reparei depois que eram uns óculos de lentes bem grossas. “Júlio, toma lá, corre agora!” Júlio saltava, falhava à primeira, agarrava à segunda, já com duas defensoras agarradas às pernas compridas. Arrastava-as pelo chão e desfalecia sobre a linha de golo. “Grande Júlio!”, rodeavam-no os colegas de equipa. E ele lá tateava a areia, enquanto agradecia, modesto: “Esta eu não podia falhar, né?”

À minha frente, um menino também estava a ver, como eu com a bicicleta momentaneamente parada. Ouvi-o dizer: “Mamã, porque é que aquele jogador é diferente dos outros?” A mãe, desconcertada, um pouco atrapalhada, lançou-se numa longa explicação: “Ó Diogo, não é diferente… Tem a pele escura por ser de África, e em África as pessoas são assim, por causa do sol…” O miúdo, com voz irritada, interrompeu-a: “Não é isso, mamã! Já reparaste que ele joga de óculos e os outros não?”

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

close-alt close collapse comment ellipsis expand gallery heart lock menu next pinned previous reply search share star